Nos EUA, a situação do presidente Donald Trump se complica. Ele pode ser acusado de cometer crime de obstrução de Justiça e, a exemplo do ex-presidente Richard Nixon no escândalo Watergate, ser obrigado a deixar o cargo
Cilene Pereira
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QUASE IGUAL Trump e Nixon: envolvidos em enredos com muitas coincidências (Crédito: AP Photo/Evan Vucci) |
Nem os mais pessimistas apostariam que o presidente dos Estados Unidos,
Donald Trump, estaria no foco de uma discussão sobre impeachment apenas quatro
meses depois de sua posse. E lá está ele. Na semana passada, ganhou fôlego
entre congressistas e sociedade civil americana a ideia de abertura de um
processo político contra o presidente que pode terminar com seu afastamento do
cargo. No centro da questão estão as suspeitas de que Trump e seus assessores
mantiveram relações impróprias com o governo russo durante a campanha
eleitoral, no ano passado, e agora, partilhando com representantes do país
europeu informações sigilosas relativas à segurança nacional. Com um enredo que
mistura vazamentos de dados, espionagem e a divulgação de notícias decisivas
pelos dois principais jornais americanos – The Washington Post e The New York
Times -, a história lembra demais o escândalo Watergate, que levou o
ex-presidente Richard Nixon a renunciar, em 1974 (leia quadro abaixo). Desta
vez, com Trump, é o Trumpgate.
O primeiro fato da confusão em que Trump se meteu ocorreu em julho de
2016, quando os democratas pediram ao FBI, a polícia federal dos EUA, que
investigasse a invasão de seus computadores por agentes da inteligência russa.
Os democratas são opositores dos republicanos, o partido do presidente. A
partir daí, fortaleceram-se as evidências de que alguns dos principais
assessores de Trump tiveram conversas comprometedoras com integrantes do
governo de Vladimir Putin, presidente da Rússia. Entre eles, Mike Flynn, nomeado
conselheiro de segurança nacional e obrigado a renunciar um mês depois por
causa de denúncias de relações suspeitas com os russos.
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DENÚNCIA Comey, do FBI, é pivô do caso contra o presidente (Crédito:Kevin Lamarque) |
O
FBI revidou
Desde o início do caso, o FBI, por meio de seu diretor, James Comey,
deixou claro que a investigação seria para valer. E assim foi, a ponto de Trump
se incomodar tanto que, no início do mês, demitiu Comey. O ex-diretor revidou.
Reportagem do New York Times publicada na terça-feira 16 revelou um memorando
escrito por Comey no qual afirma que Trump teria pedido a ele para suspender as
investigações sobre Flynn. “Deixe pra lá”, teria dito Trump. Um dia antes, o
Washington Post trouxe a manchete de que informações confidenciais sobre
ameaças do grupo extremista Estado Islâmico teriam sido partilhadas com os
russos.
Se Trump pediu mesmo a interrupção da investigação, cometeu crime de
obstrução de Justiça, passível de punição por meio de impeachment. No Congresso
americano, democratas, entre eles o senador Al Green, articulam-se para abrir o
processo. Organizações sociais, como a MoveOn.org, também pedem a saída do
presidente. O empresário J.B. Pritzker, candidato ao governo de Illinois,
talvez tenha feito o apelo mais assertivo neste sentido. “Simplesmente não
podemos nos dar ao luxo de esperar meses ou anos para saber se Trump cometeu o
crime. O Congresso deve abrir o processo de impeachment antes de Trump nos
colocar em risco novamente.”
O
Washington Post, de novo
Exatos 45 anos separam dois momentos em que o jornal americano The
Washington Post fez história no jornalismo. Em 1972, uma notícia publicada na
primeira página sobre a prisão de cinco pessoas que tentavam colocar escutas na
sede do Partido Democrata, em Washington, deu início à série de reportagens que
revelaram a participação do ex-presidente Richard Nixon no crime. Em 1974,
Nixon renunciou e os jornalistas Bob Woodward e Carl Bernstein, autores das
matérias, tornaram-se ícones. O prédio onde o crime foi cometido chama-se
Watergate, e este foi o nome como ficou conhecido o escândalo. Na segunda-feira
15, o jornal americano estampou em manchete a informação de que Trump passou
aos russos segredos sobre movimentações de terroristas que, em princípio, não
deveriam ter sido partilhadas. As informações serviram para esquentar as
propostas de impeachment e colocar o Washington Post mais uma vez como exemplo
do que é praticar o bom jornalismo.
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